Inspectora Carlota Joaquim MatchaieA Inspectora-geral do Ministério do Género, Criança e Acção Social (MGCAS), Carlota Joaquim Matchaie, passou para aposentação, depois de 42 anos (1979-2021) servindo à Função Pública. Começou por ser Educadora Vigilante (Servente) no Infantário 1º de Maio, na cidade de Maputo, e termina a missão como Inspectora-geral do MGCAS, fruto de uma progressão profissional ao longo das quatro décadas. Deixa, como legado, a implantação da Inspecção ao nível nacional, a integração dos técnicos de Inspecção na carreira de Inspector, o Manual de Procedimentos para a Inspecção Técnica, desenho dos qualificadores da área específica.


Entre as funções que Carlota Matchaie desempenhou em diferentes áreas do Sector da Acção Social, destacam-se as de: Responsável Pedagógica; Directora do Centro Infantil no 2, bem como Directora de Infantário; Chefe de Departamento de Inspecção Técnica Específica; Directora Nacional Adjunta da Mulher; Inspectora-geral Adjunta e encerra a carreira no topo, depois de nomeada Inspectora-geral, em 2013.

“Para mim, ser Educadora e ser trabalhadora de Acção Social “significa ser mãe e pai ao mesmo tempo, sem no entanto pensar nos benefícios daí advindos” é uma coisa que fazia com paixão, amor e carinho”, sublinha Carlota Matchaie, que enaltece o apoio dos pais e colegas. Ao mesmo tempo que trabalhava, continuava a estudar, para melhorar o nível profissional.

O afecto foi uma marca sempre presente durante todo o tempo que trabalhou com crianças, sobretudo órfãs e abandonadas. “Nós não tínhamos fim-de-semana, podíamos ter hora de entrada, mas não tínhamos hora de saída, porque se tivéssemos crianças doentes, tínhamos de fazer o acompanhamento hospitalar. Como Directora, eu não podia sair do Infantário sem que aquelas crianças levadas ao hospital regressassem e me inteirasse do seu estado e ponto de situação. Também, se tivéssemos crianças internadas no hospital, tinha de ter a certeza de que vamos ter alguém no hospital para acompanhar as crianças internadas”. Acrescenta que em alguns momentos trabalhava em turnos, várias vezes nenecava as crianças à noite, ao Banco de Socorros, sempre que adoecessem, porque não havia meios para chamar ambulância e não se devia pernoitar com criança doente.

A Inspectora-geral conta que enquanto trabalhava no Infantário, dedicava grande parte do tempo de fim-de-semana às crianças, em detrimento da família. “As crianças do Infantário (desamparadas) não têm pais e nós como educadores e trabalhadores sociais, tínhamos de substituir os pais; tínhamos de assumir esse papel. Se no sábado almoço com a minha família, no domingo tinha de almoçar com as crianças do Infantário e vice-versa, assim sucessivamente. Mesmo nos dias festivos, como Natal e Fim de Ano, eu não podia sair da cidade de Maputo, porque me sentia na obrigação de passar algumas horas de refeição com as crianças do Infantário. Fazia tudo isto com paixão, muito carinho e com muito orgulho”, sublinha.

A simpatia, simplicidade e vontade de aprender são outros valores apontados por Carlota Matchaie, para superar os desafios ao longo da sua carreira, que agora termina. “Para mim, não há melhor coisa que ajudar uma pessoa a sair de uma situação “aflitiva”. Sinto-me realizada quando ajudo a uma pessoa a sair de uma situação “naflitiva”.


“Inspector não é polícia”

“Ser Inspectora, para mim, é ser educadora, é ser conselheira, é ser formadora e prevenir que o erro aconteça, é preparar o terreno, é assegurar o controlo interno. Significa garantir que, quando vem uma auditoria externa, deve encontrar a casa organizada e devidamente arrumada, porque ser Inspectora não é ser polícia. Uma Inspectora não age como polícia, um Inspector é aquele que forma, é aquele que alerta, chama à atenção, este que é o papel do Inspector, garantir a transparência na gestão da coisa pública. Aqueles (Inspectores) que agem como polícia estão a deturpar o papel da inspecção. É um trabalho que realizei com muito rigor, muito amor e carinho e muita ternura e paixão”.

 

Marco histórico

Inspectora Carlota Joaquim Matchaie“Quando criamos o Instituto Nacional de Acção Social (INAS, IP), que resultou da transformação do Gabinete de Apoio à População Vulnerável (GAPVU) que se encontrava instalado só nas capitais provinciais, e trabalho social não era visível. A maior aposta é aproximar os serviços ao cidadão, estabelecendo um sistema de protecção social para as camadas mais vulneráveis da população através de Estratégia Nacional de Segurança Nacional Básico. Deste modo, o subsistema de segurança social básico abrange os cidadãos nacionais sem meios próprios de satisfazer as suas necessidades básicas e vivendo em situação de pobreza e de vulnerabilidade.

Visando redimensionar a missão do INAS, IP, foram, ao longo do tempo, aprovadas duas estratégias para reforçar, o sistema de segurança social básica, as funções de compensação devido à velhice e incapacidade funcional, a redução da pobreza e da desigualdade social e a promoção da autonomia e resiliência das camadas pobres e vulneráveis da população.

A Inspectora-geral do MGCAS gostaria de ver ultrapassados os grandes desafios que o INAS, IP tem enfrentado na implementação e gestão de programas de segurança social básica. São desafios que se reflectem na prestação de assistência social eficaz, tornando-se mais salientes na implementação e gestão da resposta da protecção social aos diferentes efeitos e dos ciclos, na demora do início na assistência social. Realizar este sonho requer persistência na interacção com os fazedores de políticas a diversos níveis, parceiros e outras instituições encarregues pela capacitação dos beneficiários do Programa Acção Social Produtiva, implementado pelo INAS, que nos permitirão melhorar as nossas intervenções em prol dos mais pobres e vulneráveis.



Perfil e desafios

Para a Inspectora-geral do MGCAS, o sector da Acção Social tem o desafio de preservar os elementos essenciais e distintos da sua natureza e função:

1. Ser trabalhador social inspirado pela vocação e não por oportunidade de emprego;
2. Prestar apoio e assistência social com rigor técnico e clareza, desde o ponto de partida (o problema social apresentado) e seguir o percurso de soluções e responsabilidades partilhadas entre o profissional e o indivíduo, família, comunidade e outros;
3. Separação clara da intervenção de assistência perante necessidades/carências da intervenção, da advocacia dos direitos;
4. Separação clara das necessidades de fórum material/financeiro e de fórum emocional/afectivo;
5. Reforçar a atenção na documentação da história social para a compreensão do passado e presente para se reflectir melhor nas soluções ao beneficiário;
6. Melhorar a supervisão do trabalhador social sénior sobre o trabalhador social principiante;
7. Melhorar o papel da intermediação social do trabalhador social para a facilitação do acesso, por parte do cidadão vulnerável aos serviços essenciais;
8. Continuar a apostar na formação dos Técnicos de nível básico e médio da Acção Social para fortalecer a dimensão prática da profissão ao nível local e da periferia na sociedade, para permitir rigor nos estágios, supervisão, na produção rigorosa dos relatórios e a promoção profissional na base de competência;
9. Redimensionar a capacidade da resposta institucional a altura da complexidade dos problemas socias de hoje que apoquentam as famílias e as comunidades;
10. Reforçar a capacidade institucional de atrair e reter o pessoal sobretudo o pessoal da carreira específica da Acção Social e Educação de Infância;
11. Apostar no investimento profissional do sector através de formação de qualidade do pessoal de carreira específica da Acção Social e Educação de Infância, fortalecimento dos sistemas de planificação e gestão e outros aspectos afins para garantir qualidade técnica e construção, expansão das infra-estruturas de prestação de serviços da Acção Social;
12. Maior e melhor divulgação do papel do sector da Acção Social junto da sociedade;
13. Melhorar a comunicação e coordenação entre e dentro dos actores públicos e da sociedade civil no âmbito da Acção Social;
14. Assegurar o equilíbrio das funções assistencialistas do Sector face a pobreza e vulnerabilidade; e
15. Garantir o rigor e integridade ética e deontologia profissional ao nível do pessoal do sector.

 

Participação política

“Em 1980 fui eleita secretária da OMM (Organização da Mulher Moçambicana) a nível da instituição, no infantário 1o de Maio. Ainda em 1984, em plena formação no Instituto de Ciências de Saúde de Maputo, fui orientada pela Direcção Nacional de Acção Social, no Ministério da Saúde para montar uma creche no Hotel Rovuma, para acolher as crianças das delegadas que vieram participar na primeira conferência da OMM, dirigida pelo camarada Presidente Samora Moisés Machel. De 2009 a 2011, quando era Directora Nacional adjunta da Mulher, servi de elo de ligação entre o Ministério da Mulher e Acção Social e a OMM (a nível central) onde realizei várias actividades”.

De 2012, até ao presente momento, sou secretaria da Célula “C” do Círculo Xiluva.

Por: Boaventura Mandlate